O vice-primeiro-ministro e representante do Ministério das Relações Exteriores da Itália, Antônio Tajani, chegou ao Brasil nessa terça-feira (8). A viagem oficial, que incluiu uma passagem pela Argentina, se deve às comemorações dos 150 anos da imigração italiana. Durante a ocasião, o representante aproveitou a oportunidade para falar a respeito das mudanças na lei de cidadania de seu país. “Devemos garantir que as regras se adaptem a um novo contexto, profundamente diferente daquele de 30 anos atrás”, disse Tajani em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.
Um projeto de lei em tramitação na Itália ameaça restringir a emissão de novas cidadanias no país europeu para descendentes e coloca em estado de alerta milhares de brasileiros, que estão entre os principais solicitantes.
O Projeto de Lei nº 752, elaborado pelo senador italiano Roberto Menia, eleva as exigências, diante do crescimento da busca pela nacionalidade. Assim, a Itália passaria a aceitar apenas os descentes de terceira geração, ou seja, bisnetos. Além disso, o postulante ainda teria de comprovar conhecimento do idioma italiano em nível intermediário, bem como a residência na Itália por, no mínimo, um ano.
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Atualmente, as condições são mais flexíveis e a comprovação de descendência italiana não depende da geração ou conhecimento prévio do idioma, muito menos a moradia no país. A proposta ainda tramita no parlamento italiano, mas, ao que tudo indica, o aumento das exigências é quase certo e pode levar muitos brasileiros a acelerar as buscas por cidadania, antes que tudo mude. Para quem já entrou com o pedido ou já obteve a chancela não haverá mudanças, segundo Nátali Lazzari, especialista em genealogia, cidadania italiana e fundadora da consultoria jurídica Avanti.
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Tajani explicou que todos dizem que “para ser italiano é preciso conhecer o italiano, a história italiana, a geografia, a constituição e a educação cívica” e é por isso que em sua proposta “Ius Italiae” [‘direito italiano’, em tradução livre], “depois de 10 anos de escolaridade obrigatória concluída com sucesso, você pode se tornar um cidadão italiano”.
Número de interessados
A União Europeia (UE) concedeu cidadania a cerca de 25,9 mil brasileiros em 2022, aumento de 26% em relação ao ano anterior. Com isso, os brasileiros figuram entre as dez nacionalidades do mundo que mais obtiveram cidadania nas nações que integram a região. De todas as cidadanias solicitadas, 70% foram obtidas na Itália e em Portugal, conforme levantamento do Eurostat (instituto de estatísticas da UE).
O Brasil abriga uma das maiores comunidades italianas do mundo. Dos cerca de 6,5 milhões de cidadãos italianos residentes no exterior, mais de 700 mil moram no Brasil, o que corresponde a cerca de 11% do total, conforme dados da Embaixada da Itália no Brasil. A estimativa é de que existam 30 milhões de descendentes no país.
Diante da ameaça do novo projeto, a especialista alerta que, quem sonha obter a cidadania italiana, este é o momento ideal para dar entrada no processo. “Se o projeto for aprovado, ele vai mudar toda a forma de concessão impondo condições mais rígidas e vai afetar em cheio os brasileiros. Isso porque boa parte da população brasileira de origem italiana já é trineta ou tetraneta, em alguns casos”, explica Nátali.
A especialista frisa que buscar a cidadania italiana possibilita ao postulante obter diversos benefícios, incluindo incentivos financeiros, estudantis e a possibilidade de viajar pela Europa ou até para outros países, como Estados Unidos e Canadá, para estudar ou trabalhar, sem necessidade de visto. Além disso, ainda há oportunidades imobiliárias, como foi oferecida pelas autoridades da Toscana, que lançaram um programa de benefícios, pagando de 10 mil a 30 mil euros (entre R$ 59 mil e R$ 177 mil) para que pessoas comprem imóveis na região, desde que o requerente seja cidadão italiano, de outro país da União Europeia ou que tenha uma autorização de residência com duração mínima de 10 anos.
O benefício é parte do programa “Residenzialità in Montagna 2024” para auxiliar na cobertura de gastos de compra e reforma de imóveis em cidades selecionadas. O objetivo é atrair novos residentes para as comunidades de áreas montanhosas e rurais para revitalizá-las economicamente, rejuvenescendo também a população, uma vez que a região sofreu bastante com a saída de jovens para áreas urbanas. Além da Toscana, outras regiões da Itália, como Molise e Sicília, também oferecem oportunidades similares de compra ou até doação de imóveis para novos residentes.
“Essa é uma grande oportunidade para quem deseja viver nessas regiões, usufruindo dos benefícios da dupla cidadania”, afirma Nátali. Segundo a especialista, os brasileiros podem obter a cidadania pelo princípio do “ius sanguinis”, ou direito de sangue, que garante que é um cidadão italiano todo descendente de ancestral italiano, sem limite geracional. “Não dá para perder esse benefícios”, frisa.
Mas, para a advogada Camila Briganti, especializada em cidadania italiana e sócia fundadora da Briganti Avvocati Associati, essa mudança não deve ocorrer tão rapidamente. Isso porque diferentemente do Brasil, a Itália tem um sistema legislativo denominado bicameralismo perfeito, que obriga a discussão e aprovação de cada projeto de lei por ambas as câmeras para poder entrar em vigor. “Ou seja, quer dizer que todo procedimento será longo, complicado e demorado”, disse Camila, acrescentando que esta não é a primeira vez que se tenta modificar a legislação italiana sobre a cidadania ius sanguinis e, até hoje, não aconteceu.
Como conseguir cidadania italiana?
Existem duas vias para solicitar a cidadania italiana: administrativa e judicial. A via administrativa permite que o requerimento da cidadania italiana seja feito sem representação jurídica. O pedido pode ser feito pelo requerente (o descendente interessado na cidadania) por meio de consulados italianos no Brasil ou, no caso de brasileiros residentes na Itália, por meio da comune, a sede administrativa do município onde mora.
Consulado italiano
Essa via não exige deslocamento até a Itália. O requerente se dirige ao consulado italiano de sua preferência para iniciar o processo. O ponto negativo é a demora: atualmente, a fila está em mais de 10 anos;
Comune
Essa opção é a mais rápida, mas também pode ser a mais cara. Isso porque, apesar da duração de geralmente seis meses, no processo via comune só serve para quem reside na Itália legalmente. Uma vez morando na Itália – e é obrigatório permanecer no país durante todo o processo – o requerente abre o pedido de cidadania direto na sede administrativa do município (ou comune).
Judicial
A via judicial é um processo em que, como o nome diz, a solicitação da cidadania é requerida perante um juiz. Esse processo pode ser feito com o requerente permanecendo no Brasil. Apesar da necessidade de assessoria jurídica, que tem um custo mais alto, o modelo tem a vantagem de não exigir residência na Itália, representando economia com passagem, moradia e alimentação. Pela via judicial, é possível pedir a cidadania para mais de um familiar, mas o custo fica mais alto. Mas em um grupo familiar isso pode ser diluído entre os participantes.
Quais documentos são necessários?
Para requerer a cidadania italiana são necessárias certidão de nascimento, de casamento e de óbito de todos os familiares dos quais o requerente descende (pais, avós, bisavós, trisavós, tataravós) e do antepassado italiano. Uma consultoria com presença e/ou contatos na Itália facilita a obtenção dos documentos. Mas é importante ficar atento para não cair em golpes.
Todos os documentos devem ser traduzidos para o italiano, sob tradução juramentada, e apostilados (registrados em cartório e com um selo que ateste a veracidade e validade dos documentos traduzidos).
Atenção à grafia do sobrenome
É importante estar atento à forma como se escreve um sobrenome. Isso porque é muito comum que descendentes de italianos carreguem nomes que tem a grafia “aportuguesada”.
O InfoMoney encontrou alguns exemplos: Piero virou Pierri, Cauteruccio que virou Canterucci, Rizziero se tornou Rizério.
Para obter a cidadania italiana, é necessário alterar no Brasil toda a documentação dos ascendentes, além do próprio requerente, mudando para a grafia “italiana” do sobrenome do antepassado.