Um supermercado em Santa Catarina foi condenado a pagar o dobro pelo dia às empregadas que não folgavam aos domingos a cada 15 dias. A decisão foi da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), do Tribunal Superior do Trabalho. O SDI-1 considerou que a regra especial da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que prevê revezamento quinzenal para o trabalho da mulher aos domingos, prevalece no ordenamento jurídico.
Conforme consta no processo do caso, a ação foi movida pelo sindicato dos empregados do comércio da região em 2017. A queixa era de que as empregadas trabalhavam com uma escala 2×1 aos domingos. Isto é, a cada dois domingos trabalhados, elas folgavam um. Mesmo as trabalhadoras tendo uma folga semanal, o sindicato argumentou que a CLT prevê a escala dominical 1×1. Como a regra foi descumprida, a ação trabalhista pediu o pagamento em dobro dos domingos e o adicional de 100%.
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Por outro lado, o supermercado alegou que a Constituição não obriga que a folga semanal seja aos domingos, mas preferencialmente. Além disso, não há distinção sobre o descanso entre homens e mulheres, nem impedimento para que o empregador conceda folgas e outros dias da semana.
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Qual foi o entendimento da justiça sobre o trabalho de mulheres aos domingos?
Até chegar à SDI-1, o processo passou pela apreciação do juízo de primeiro grau e pela Quarta Turma do TST. Nessas instâncias, o pedido do sindicato não havia sido completamente acatado, levando-o a recorrer até a Subseção Especializada, órgão que uniformiza a jurisprudência do tribunal do trabalho.
Com isso, o caso chegou às mãos do ministro José Roberto Pimenta, relator do caso. Em sua decisão, ele ressaltou que o tratamento especial dado às mulheres trabalhadores deve–se à dupla jornada. “Não afronta o princípio da isonomia o dispositivo de lei que lhes assegure maiores possibilidades de convívio social e familiar em períodos destinados ao repouso, como no caso dos domingos”, disse na decisão.
Além disso, Pimenta argumentou que mesmo que as regras da CLT sejam datadas da década de 1940, as mulheres não deixaram de ser as responsáveis pela gestão da família, em especial, filhos e tarefas domésticas. “Em razão disso, todo o capítulo de proteção à mulher, constante da CLT, ainda possui validade, sendo que, os dispositivos legais nele constantes, não revogados, expressamente, possuem validade e devem ser aplicados nos dias atuais.”
Por que prevaleceu a regra da CLT?
No capítulo “Da duração, condições do trabalho e da discriminação da mulher” da CLT, o artigo 386 diz que: “havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical”.
Ao Infomoney, Laís Epaminondas, membro do Serur Advogados, explica que a aplicação da escala diferenciada de repouso semanal para mulheres é uma norma protetiva com respaldo constitucional. “Não havendo o que se falar afronta à igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres, sendo admissível a possibilidade de tratamento diferenciado sem ofensa ao princípio constitucional da isonomia”, diz a advogado. Ela segue a mesma argumentação do relator do caso, apontando que a proteção diferenciada para resguardar a saúde da trabalhadora considera condições específicas impostas às mulheres pela realidade social e familiar.
Enquanto isso, o sócio da área trabalhista do NHM Advogados, Henrique Melo, lembra que esse tema tem sido alvo de discussões há tempos. O principal ponto conflitante é a lei 10.101/2000, que prevê que, para as atividades do comércio em geral, o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo. “A norma passou a ser utilizada pelas empresas do comércio para todos os seus empregados, homens e mulheres, em sobreposição ao artigo 386 da CLT, baseando-se também na Constituição Federal.”
No entanto, Melo aponta que no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.403.904 (concluído ao final do ano de 2022) o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a escala diferenciada de repouso semanal, prevista no artigo 386 da CLT, é norma protetiva dos direitos fundamentais sociais das mulheres. “O STF definiu que a trabalhadora mulher faz jus à condição especial de proteção para o trabalho aos domingos, para resguardar a saúde da trabalhadora.”