Enriquecidos pela grande valorização das ações da empresa, os colaboradores da Nvidia aceitam quase qualquer coisa, inclusive uma cultura de trabalho exigente e por vezes prejudicial à saúde.
As ações da companhia valorizaram mais de 3.000% desde o início de 2019, o que deixou muitos de seus colaboradores milionários. No entanto, apesar de ricos, os trabalhadores costumam estar tão ocupados no escritório que não conseguem aproveitar isso, segundo disseram à Bloomberg dez colaboradores e ex-colaboradores em condição de anonimato. Mesmo assim, poucos estão dispostos a deixar a empresa se isso significar arriscar ações adquiridas.
Um ex-colaborador que atuava no suporte técnico para clientes corporativos e deixou a empresa em maio relatou que costumava trabalhar sete dias por semana, frequentemente encerrando sua jornada na madrugada, entre 1h ou 2h. Ele acrescentou que outros, especialmente do departamento de engenharia, trabalhavam ainda até mais tarde. O ex-colaborador afirmou que, em alguns momentos, a pressão resultava em discussões e gritos durante reuniões. No departamento de marketing, outra ex-colaboradora, que deixou a empresa em 2022, relatou que discussões e gritos também eram frequentes durante as reuniões que envolviam mais de 30 pessoas e das quais ela participava de sete a dez vezes por dia.
Um porta-voz da Nvidia não quis comentar o assunto.
Parte da cultura de trabalho exigente deriva do CEO de longa data, Jensen Huang, que já admitiu que não é fácil ser subordinado a ele. Em uma entrevista concedida ao programa de TV 60 Minutes em abril, Huang afirmou que, de qualquer forma, trabalhar na Nvidia não deveria ser fácil.
“Se você quer realizar coisas extraordinárias, não deve ser fácil”, disse à época.
No entanto, apesar das pressões de trabalhar na Nvidia, a taxa de rotatividade de colaboradores na empresa é muito menor do que a média do setor. De acordo com o Relatório de Sustentabilidade da Nvidia para o ano fiscal de 2024, em 2023, a rotatividade da empresa foi 2,7%, em comparação com 17,7% no setor de semicondutores em geral.
Um dos motivos pelos quais os colaboradores não deixam a empresa é a oportunidade de trabalhar na vanguarda da tecnologia, na liderança do setor de chips de IA. Outra motivação é aguardar as concessões de ações se efetivarem, o que, na Nvidia, geralmente ocorre ao longo de um período de quatro anos. Quem sair antes pode perder um pagamento significativo.
A alta valorização das ações da Nvidia já deixou seus executivos entre os mais ricos do setor de tecnologia. Com cerca de 3,5% de participação na empresa, Huang é a 12ª pessoa mais rica do mundo, com um patrimônio líquido de US$ 111 bilhões, segundo o Bloomberg Billionaires Index. De acordo com a Bloomberg, as ações da Nvidia da CFO Colette Kress, avaliadas em US$ 757,8 milhões, a colocam acima de suas contrapartes na Intel e na AMD, cujas participações não ultrapassam US$ 10 milhões.
Por meio do plano de compra de ações para colaboradores da Nvidia, empregados podem contribuir com até 15% de seu salário para adquirir ações da empresa com um desconto de 15%. Um funcionário de nível médio que comprou participações ao longo de 18 anos supostamente se aposentou com ações no valor de US$ 62 milhões, conforme relatado por Tae Kim, editor sênior de tecnologia da Barron’s.
Toda essa riqueza em ações cria uma dinâmica incomum no local de trabalho, mesmo entre colaboradores que não estão no alto escalão da empresa. Um ex-colaborador da engenharia que deixou a empresa em junho relatou à Bloomberg que, em 2023 e neste ano, era comum ouvir falar sobre novas casas de veraneio e ver colegas navegando no Zillow durante o trabalho.
É comum ver Porsches, Corvettes e Lamborghinis no estacionamento do escritório da Nvidia em Santa Clara, Califórnia. Alguns carros são até verde-limão, em homenagem ao logotipo da empresa que possibilitou esses luxos.
Esta matéria foi publicada originalmente em Fortune.com