Enquanto a Bolsa brasileira caminha para encerrar 2024 de forma melancólica, com queda de quase 10% no ano – principalmente por conta do risco fiscal -, estrategistas de mercado já destacam os debates que estão no radar para 2025. Com a recente queda do Ibovespa, que voltou para a casa dos 121 mil pontos, a visão é de que as ações estão atrativas – mas só isso não basta e o Brasil precisará de avanços na frente macroeconômica para criar catalisadores positivos para o mercado.
O Morgan Stanley, que recentemente reduziu a exposição no Brasil em América Latina para underweight (abaixo da média), destacou que o Brasil tinha até então evitado maiores turbulências enquanto continuava a apresentar um desempenho fiscal insatisfatório, o que alguns chamam de “narrativa do aluno C”.
O banco destaca a visão de alguns investidores de que essa situação insatisfatória não mudará, enquanto argumenta que um cenário de alta para o Brasil está intimamente ligado à necessidade de reequilibrar o crescimento, direcionando-o para investimentos e exportações (I&X) e afastando-se do gasto governamental e do consumo (G&C).
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A análise dos estrategistas aponta que, para que o Brasil voltar a entrar em um ciclo de alta, é fundamental que haja uma redução nas taxas de juros e nos gastos públicos.
Atualmente, o Morgan vê que o modelo econômico de déficit elevado já está em estágio avançado, com um déficit orçamentário que atinge 2,7% do PIB, cerca de US$ 50 bilhões. Se a economia enfrentar uma desaceleração severa, esse número pode aumentar. Adicionalmente, o preço sobre lucro (P/L) das ações brasileiras não pode se expandir enquanto as taxas de juros estiverem altas e o risco permanecer elevado.
O investimento no Brasil está em níveis recordes baixos, representando apenas 17% do PIB, inferior ao da Argentina. Isso indica que o crescimento está excessivamente dependente do consumo e dos gastos do governo, impulsionados por uma crescente alavancagem. A alta nas taxas de juros tem pressionado ainda mais os investimentos, que caíram para níveis mínimos.
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O banco diz que a deterioração fiscal continua sendo uma preocupação central para os investidores
Essa baixa taxa de investimento é em grande parte resultado dos altos custos de financiamento e da incerteza em torno da trajetória fiscal. Um novo ciclo de investimentos poderia sinalizar uma mudança estrutural nas dinâmicas de mercado, mas a responsabilidade fiscal e a redução das taxas são condições prévias.
“Para que o Brasil aproveite seu mercado de capitais, com aproximadamente US$ 1,8 trilhão em ativos sob gestão, é necessário reduzir as taxas de juros, promovendo um ciclo de investimento que poderia impulsionar um caso de alta para as ações locais”, avalia.
“Ainda há tempo para corrigir o curso, mas o risco-recompensa não é atraente até que vejamos mudanças na política. Se o Brasil tiver uma gestão rumo ao Grande Reequilíbrio, poderemos ver um cenário otimista para ações locais”, complementam os estrategistas do banco americano.
Enquanto isso, o cenário negativo (ou bear case) do Brasil está vinculado a um pouso forçado para lucros e pelo assunto do momento, a dominância fiscal.
“Estamos underweight em Brasil, pois estamos preocupados que os formuladores de políticas brasileiras possam estar subestimando os riscos fiscais futuros. As expectativas de inflação estão aumentando, o real está sendo vendido e as taxas estão subindo”, aponta o Morgan, ressaltando que o risco de um pouso forçado para os lucros brasileiros está aumentando rapidamente. Com maiores níveis de dívida e maiores taxas de juros, a relação de juros/PIB pode aumentar ainda mais.
A dominância fiscal é caracterizada por uma perda de eficácia da política monetária em cenário de desarranjo das contas públicas. Em ambiente desse tipo, uma alta nos juros básicos pelo BC para domar os preços eleva o gasto do governo com pagamento de juros da dívida pública e aumenta o problema fiscal a ponto de deteriorar expectativas de mercado, afetando condições financeiras, o que acaba por pressionar ainda mais a inflação.
O Morgan Stanley expressa preocupação de que os formuladores de políticas brasileiras estejam subestimando os riscos fiscais à frente. As expectativas de inflação estão aumentando, o real está se desvalorizando e as taxas estão subindo. As incertezas em torno do modelo econômico do Brasil, que depende de alavancagem contínua, podem aumentar a percepção de risco entre os investidores.
A política é um fator crucial nesse cenário. Brasil e México, juntos, têm cerca de US$ 130 bilhões em lucros anuais, comparáveis ao total na Índia, um mercado emergente que representa três vezes o peso da América Latina no MSCI Emerging Markets. Apesar de Brasil e México apresentarem níveis semelhantes de rentabilidade, eles enfrentam desafios relacionados à percepção de risco e à sustentabilidade de seus modelos econômicos.
Perspectivas para 2025
Embora 2025 não pareça ser o ano de mudanças significativas no cenário de investimentos, a necessidade de uma transição do modelo econômico de G&C para I&X é evidente, apontam os estrategistas. O Morgan Stanley acredita que isso é possível, mas ainda distante. A baixa exposição de fundos locais em ações brasileiras oferece um potencial de crescimento significativo, caso as taxas locais diminuam, representando cerca de R$ 800 bilhões, ou 23% da capitalização de mercado do MSCI Brasil.
Com isso, embora exista um potencial para um mercado em alta no Brasil, isso depende de um reequilíbrio significativo na economia, com foco em investimentos e exportações, além de uma gestão fiscal responsável. No curto prazo, a recomendação é focar no “Texas Trade”, que inclui setores como petróleo, agricultura e tecnologia, enquanto aguarda um sinal claro de mudança nas políticas econômicas brasileiras.
A XP também ressalta que, recentemente, o sentimento do mercado está alcançando níveis extremos de pessimismo, destacando pesquisa com assessores de investimentos que mostra que a proporção de clientes planejando reduzir a alocação em renda variável atingiu um nível próximo do máximo histórico em 40%. Já os investidores institucionais seguem cautelosos, mas percebem uma assimetria de risco positiva em relação aos temas fiscais e monetários, com a maioria deles – em torno de 60% – esperando manter sua exposição em renda variável.
“Pelo lado positivo, níveis de extremo pessimismo historicamente coincidem com as mínimas de mercado, o que pode significar uma oportunidade valiosa para se posicionar. Porém, esse sentimento por si só não será capaz de causar uma recuperação nas ações brasileiras”, avalia.
Na visão de Fernando Ferreira, Felipe Veiga e Júlia Aquino, que assinam o relatório da XP, qualquer recuperação do mercado dependerá de a) fluxos e b) um catalisador relevante que leve a essa recuperação de preços. “Nesse cenário, uma alocação cautelosa, focada em nomes defensivos, com carrego sólido, baixa alavancagem financeira e boa dinâmica de lucros é a melhor estratégia para o investidor em renda variável”, apontam.