Um impasse sobre os efeitos da decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que impôs condições para o pagamento de emendas parlamentares, travou o avanço do pacote fiscal na Câmara dos Deputados e ameaça jogar a votação dessas medidas na Casa para 2025, afirmaram à Reuters, nesta segunda-feira (9), três fontes com conhecimento das tratativas.
Uma fonte ligada ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que, sem um recuo de Dino e do Supremo – cujo plenário referendou a decisão do ministro – e a retomada da liberação das emendas, é “muito provável” que nada avance este ano na Casa.
Pelo calendário legislativo, o governo tem apenas mais duas semanas de trabalhos dos parlamentares para aprovar o pacote fiscal, que prevê uma contenção de despesas públicas de cerca de R$ 70 bilhões até 2026. “Não é uma situação política simples e de fácil resolução. O Judiciário precisa fazer algum gesto”, afirmou essa fonte.
ACESSAR AGORA
Dino liberou o repasse das emendas de relator, de comissão e as chamadas “emendas Pix”, que estavam suspensas desde agosto, mas colocou uma série de condicionantes para se cumprir regras referentes à transparência, à rastreabilidade e ao controle público.
Apesar de posteriormente respaldada pelo plenário do Supremo, a determinação de Dino causou revolta entre os congressistas por considerar que o magistrado ignorou os termos de uma proposta aprovada pelo Congresso sobre o assunto.
Leia também
No STF, Dino rejeita integralmente pedido do governo para rever decisão sobre emendas
O governo recorreu da decisão que liberou emendas após deputados e senadores mostrarem insatisfação e ameaçarem travar a tramitação do pacote de corte de gastos no Congresso Nacional
O governo, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), chegou a apresentar ao STF um pedido de esclarecimentos sobre o alcance da decisão, como os critérios para a liberação das emendas. Há quem avalie que o governo teria condições de fazer com que Dino – que foi ministro da Justiça do governo Lula, que o indicou ao Supremo – pudesse rever a sua decisão. Contudo, no início da tarde desta segunda, Dino decidiu manter integralmente sua decisão e rejeitou o recurso.
Outro ponto de ruído para os parlamentares é a liberação das emendas. Na semana passada, em reunião com a presença de Lira e líderes partidários, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), informou que o Executivo se comprometeu a pagar 7,8 bilhões de reais em recursos de emendas parlamentares que estavam represadas, segundo uma fonte com conhecimento das tratativas.
Mas os parlamentares querem uma aceleração da liberação desses recursos para melhorar o ambiente na Câmara.
Insuficiente
Um dos vice-líderes do governo na Câmara, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) admitiu que há risco de o pacote de ajuste não ser votado este ano. Paulo, que é autor de uma PEC mais dura de ajuste fiscal, ainda adicionou um ingrediente nas discussões.
“O Congresso não confia que o pacote é suficiente para reverter a situação fiscal”, afirmou.
Leia também
Senado vota regulamentação da IA e Programa de Transição Energética na terça-feira
Projeto prevê regras para o desenvolvimento e o uso de sistemas de IA. O relatório aprovado pela comissão temporária exclui da lista de sistemas considerados de alto risco os algoritmos das redes sociais
Uma fonte do Palácio do Planalto disse à Reuters que o governo está ciente dos desafios e trabalha para resolver os impasses. Essa fonte afirmou que os ministros da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), e da Fazenda, Fernando Haddad (PT), se reúnem nesta tarde com líderes partidários da Câmara para discutir o assunto.
Nova reunião
Está prevista para terça-feira (10) uma outra rodada de reunião do presidente da Câmara com os líderes da Casa sobre esse e outros temas. Em entrevista ao UOL, publicada nesta segunda, Lira disse que, enquanto o governo não liberar as emendas, não vai indicar o relator das propostas do pacote fiscal.
“Não temos apoio nem da Câmara nem do Senado sem resolver o impasse do projeto votado e sancionado”, disse ele.
Até o momento, só houve a aprovação da urgência aos dois projetos de lei do governo sobre o ajuste. A PEC, que é o principal texto e de tramitação mais difícil, está paralisada.
Não bastassem essas questões, a bancada do PSD da Câmara, partido do “centrão” que tem 44 deputados, tem se sentido desprestigiada no governo e gostaria de ter um ministério mais robusto para continuar a apoiar o Planalto, segundo uma fonte da legenda. Atualmente, o partido tem o deputado André de Paula (PSD-PE) como ministro da Pesca.
O partido tem outros dois ministérios, o da Agricultura e o de Minas e Energia, mas eles estão com representantes da bancada do Senado.