O mercado está em conversas para ajustar as regras para o investimento de não residentes nos mercados financeiro e de capitais do Brasil. E por que isso poderia interessar aos brasileiros? Porque a perspectiva é que facilitar a entrada de recursos externos deve desenvolver a indústria local, segundo especialistas ouvidos pelo Broadcast Investimentos.
“Câmbio no Brasil sempre foi algo complicado, mas a lei do novo marco cambial, que entrou em vigor no final de 2022, traz um princípio importante que é ‘ao capital estrangeiro deve ser dado o mesmo tratamento do capital nacional’. Já vieram regras novas desde então, mas ficou para o final essa consulta pública sobre os investimentos que os estrangeiros fazem no Brasil. E o objetivo é simplificar isso”, afirma José Luiz Homem de Mello, sócio do Pinheiro Neto Advogados especializado em corporate finance. Ele reforça ser um passo importante, dado que trata de dinheiro entrando em títulos, ações e demais valores mobiliários.
Hoje há cerca de R$ 1,8 trilhão de ativos de estrangeiros investidos no Brasil através da regulamentação 4373, que trata do tema, segundo Roberto Paolino, diretor da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima). O maior valor é de grandes fundos que utilizam a estrutura da 4373 e vão se beneficiar da desburocratização de processos operacionais, mas as mudanças também olham para investidores pessoa física, brasileiros com residência fiscal fora do Brasil ou estrangeiros.
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“Atualmente, há uma falta de clareza sobre o que o investidor não residente pode ter no Brasil. Um brasileiro que faz sua saída definitiva, para efeitos tributários, a princípio só poderia ter CDBs (Certificados de Recebíveis Bancários) ou poupança”, diz Paolino. Então, em teoria, se o brasileiro tivesse posição em ações ou cotas de fundos, ele deveria vendê-las ao mudar de país. Os ajustes propostos vão limitar em R$ 1 milhão por mês as transações do investidor pessoa física aqui, com requisitos mais simples para abrir a conta através de corretoras ou bancos, que terão flexibilidade para definir seus próprios critérios de risco.
Desse modo, segundo o diretor da Anbima, trata-se de uma mudança “muito positiva” para o longo prazo. “Não é porque a regulamentação vai ser alterada que haverá um fluxo enorme de pessoas físicas, sejam brasileiras no exterior ou estrangeiros, para investir no Brasil. É um processo lento e que se educa”, afirma Paolino. Mas ele observa a estimativa de que os estrangeiros respondem por cerca de 1/3 dos ativos negociados e depositados na Bolsa brasileira hoje. “Difícil dizer se esse número vai aumentar, mas nos últimos dez anos é notável como a pessoa física aumentou seus investimentos em Bolsa. Seria razoável olhar para isso.”
Homem de Mello, do Pinheiro Neto, pontua que há uma competição no mundo globalizado e, se o estrangeiro tiver dificuldades para investir em um país, ele vai procurar outra jurisdição. “[As mudanças] vão trazer investimentos para o Brasil em um momento em que tanto precisamos atraí-los”, afirma. Na mesma linha, Leonardo Camozzato, sócio e presidente executivo (CEO) da HMC Capital no Brasil, destaca que se o País quer se integrar à economia global, esse é um passo importante.
O trabalho da HMC Capital é mostrar para gestores globais que faz sentido oferecer produtos no Brasil, ou seja, na outra ponta do negócio. Mas Camozzato observa que, em negócios cross border (transfronteiriços), “o ideal é que a via de mão dupla esteja aberta”. “O gestor estrangeiro às vezes quer colocar um seed money no próprio fundo para mostrar o comprometimento com o País, mas quando olha a quantidade de etapas para fazer um simples investimento, questiona o preparo brasileiro.”
“Se facilitarmos o acesso, o fluxo vai aumentar e a indústria local de investimentos vai ter mais contato com os investidores globais. Será preciso falar a língua deles, buscando os retornos e as garantias com as quais estão acostumados. Isso deve desenvolver o arcabouço regulatório por trás. É uma nova abertura e vai ‘subir a barra’”, avalia Camozzato.
Para o responsável por Sales and Services da área de Securities Services do Citi, Frederico Leonel, a expectativa é que o mercado brasileiro se aproxime mais de padrões internacionais o que, como resultado, deixará “toda a dinâmica mais eficiente”. “Estamos num caminho positivo e esperamos ver resultados ao longo do tempo”, diz Leonel. De acordo com dados da Anbima, o Citi possui a maior custódia do volume de não residentes, com 64% do total.
A consulta da CVM e do BC foi realizada no início de setembro. A expectativa é que as novas normas saiam até o final do ano, passando a vigorar em 2025.