Como destaca editorial do jornal “O Estado de S. Paulo” desta terça-feira, apesar da boa receptividade junto aos agentes econômicos privados da escolha do economista Joaquim Levy para ministro da Fazenda, prenúncio de que a “nova matriz macroeconômica” adotada nos últimos anos será substituída por ações mais ortodoxas, a confiança de que essas mudanças de fato ocorrerão ainda não existe de fato.
O boletim Focus, a pesquisa semanal do Banco Central com cerca de 100 especialistas, fechado na sexta-feira (ou seja, depois da fala do ministro indicado e seus dois colegas de triunvirato econômico, Nélson Barbosa, do Planejamento, e Alexandre Tombini, Banco Central) mostra bem isto. Subiram as previsões de inflação para 2014 e 2015 e caíram as previsões do PIB para os dois períodos.
Informações sobre a “nova” política econômica em “O Globo”: as propostas em discussão nos gabinetes da transição são reduzir gastos com pessoal e custeio ao longo do tempo e estabilizar os desembolsos com programas de transferência de renda. Já o reforço para os cofres públicos pode vir da retomada da cobrança da Cide, tributo que incide sobre os combustíveis; da recomposição de alíquotas que foram reduzidas nos últimos anos, além da elevação do PIS/Cofins para produtos importados e de mudanças na tributação de cosméticos, entre outras medidas.
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Segundo o “Valor Econômico”, do leque de alternativas para engordar as receitas da União em 2015 consta o fim da dedução da despesa com juros sobre capital próprio (JCP) da base do Imposto de Renda. Essa medida, se adotada, renderia cerca de R$ 15 bilhões aos cofres públicos, contribuindo com quase 0,3% do PIB no ajuste fiscal previsto para o próximo exercício.
Ainda de acordo com o “Valor”, o ajuste fiscal deve começar com uma nova desoneração tributária, exatamente o oposto do que se espera. É que o governo se prepara para editar até o fim do ano uma medida provisória (MP) que corrige a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) com o objetivo de cumprir a promessa feita em rede de rádio e TV pela presidente Dilma Rousseff, durante discurso do Dia do Trabalho.
Sobre tudo isso, de Dilma, agora, pouco se saberá: ela continua fechada – cancelou a vinda a São Paulo para um evento reunindo investidores.
Autonomia no dia a dia
Porém, o restabelecimento da confiança nas autoridades parece estar ligado menos às intenções dos ministros e mais a demonstrações práticas e objetivas de que o triunvirato tem mandato real para tocar a política econômica, sem interferência do Palácio do Planalto, como ocorreu na gestão Guido Mantega, nem injunções de ordem político-partidária.
O próprio Joaquim Levy alimentou esta incerteza, na entrevista de apresentação da equipe na quinta-feira passada, quando, diante da pergunta de um repórter sobre o grau de autonomia que havia recebido da presidente Dilma Rousseff, disse que ela será testada, comprovada, no dia a dia. Para muitos analistas, nem o próprio Levy sabe o tamanho dos passos que pode dar.
E ontem, sem relação direta com o trabalho do futuro substituto de Mantega, mas dentro desse contexto, Dilma deu uma demonstração de que ainda está sujeita às tais injunções de ordem política – ou, como escreveram alguns jornais, à chantagem aberta de seus aliados.
Diante das dificuldades criadas pelos parceiros para aprovar a mudança do superávit primário na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, essencial para que a presidente e auxiliares não incorrem em crime de responsabilidade fiscal, Dilma pôs na mesa seus critérios para a barganha. Não a rechaçou.
Editou um decreto com novas destinações de verbas no qual empenha R$ 444,7 milhões para emendas dos parlamentares ainda bloqueadas. O valor garante mais R$ 748 mil para cada um dos 513 deputados e 81 senadores este ano – dinheiro a ser empregado em obras nos redutos eleitorais deles.
Normalmente, a verbas das emendas parlamentares são liberadas em etapas, de acordo com o andar da arrecadação, e também para permitir esse tipo de toma lá, dá cá. Não é anormal, do ponto de vista da cultura brasileira, esse tipo de negociação.
Só que desta vez o governo inovou: no próprio decreto condicionou a liberação efetiva dos R$ 444,7 milhões à aprovação da alteração na LDO. Não ficou claro se todos forem beneficiados ou apenas os que votarem a favor. A votação está prevista para hoje à tarde.
Cada parlamentar fecharia do ano com R$ 11,6 milhões destinados às suas bases eleitorais com a nova liberação. A notícia foi dada ontem a 23 líderes partidários que estiveram reunidos com a presidente ontem no Planalto, para traçar a estratégia para votação dos projetos cruciais para o governo neste fim de ano – além do da LDO de 2014 e LDO de 2015 e o Orçamento do ano que vem.
Informam os jornais que foi reconfirmado também o pacto entre Congresso e governo do primeiro semestre de não aprovação de projetos que aumentem as despesas federais e a presidente considerar desnecessários no momento.
Recursos adicionais para as emendas parlamentares à parte, o principal aliado de Dilma, o seu próprio partido, o PT, continua armando-se para dar dores de cabeça à presidente.
O documento final da reunião do diretório nacional sexta e sábado em Fortaleza diz textualmente que o partido deve “participar ativamente” da definição dos rumos da política econômica.
E em discurso para os catadores de lixo reciclável em São Paulo, o ex-presidente Lula incentivou-os a cobrar a presidente Dilma Rousseff por mais benefícios. Lula afirmou que tem dito à presidente Dilma que quem está no governo precisa saber “de que lado está” e para quem deve priorizar os programas de política pública.
Tem boi na linha da Agricultura
Na mesma linha, a presidente teve de se entender com um outro parceiro da campanha da reeleição, este no campo dos financiadores.
Um dos proprietários da JBS Friboi, Joesley Batista, não gostou da indicação da senadora Kátia Abreu, com quem teve atritos no passado, para o Ministério da Agricultura. A descrição da insatisfação chegou ao vice-presidente Michel Temer e dele foi ao Palácio do Planalto.
Feitas gestões políticas, convencida de que era preciso apagar esse incêndio, a presidente recebeu o queixoso – cuja empresa foi a maior patrocinadora da campanha reeleitoral, com R$ 69,7 milhões – para uma conversa na semana passada no Palácio do Planalto.
A história está contada na edição de hoje na “Folha de S. Paulo”, confirmada, segundo a reportagem, por três integrantes do primeiro escalão do Palácio do Planalto e dirigente do PMDB com acesso às conversas em torno da composição do ministério.
“O Estado de S. Paulo” também tem a informação, mas diz que o encontro de Joesley no Palácio do Planalto foi com o ministro Aloizio Mercadante, na quarta-feira, fora da agenda oficial da Casa Civil.
Contudo, Dilma não dá sinais de que via recuar, mesmo com as pressões também do PMDB e de alas do PT. A conferir.
Petrobrás: nenhuma disposição
para aceitar álibi das empresas
Está previamente frustrada a expectativa da oposição de arrancar novas revelações sobre o escândalo da Petrobrás na reunião de hoje na CPI mista que investiga o caso, até agora sem nenhuma contribuição para esclarecimento dos desvios anotados na estatal.
O advogado do ex-diretor da empresa, Paulo Roberto Costa, um dos suspeitos de comandar o esquema e sob o regime da delação, avisou que usará o direito constitucional de ficar calado na acareação com o também ex-diretor Nestor Cerveró, igualmente arrolado nas investigações do Ministério Público e da Polícia Federal.
Se desse modo, com depoimentos pífios e a pouca vontade de investigar de fatos dos parlamentares, as CPIs no Congresso (há também uma exclusiva do Senado) caminham melancolicamente para o fim, não vão dar em nada, na esfera da justiça o cerco sobre a estatal e os suspeitos de falcatruas está se fechando cada vez mais.
O juiz Sérgio Moro, um dos responsáveis pelas investigações, deu novos sinais de que não vai aceitar mesmo a tese de que as empreiteiras investigadas na Lava Jato cometeram apenas crime de formação de cartel.
Em despacho, ao negar liberdade a Sérgio Cunha Mendes, da Mendes Júnior, Moro explicou: “Além dos crimes praticados via cartel, aparentam existir iniciativas criminosas isoladas das empreiteiras, ou seja, crimes similares perpetrados mesmo fora do cartel”.
Segundo o magistrado, diz reportagem da “Folha”, indícios sugerem que esquema é “superior a uma exigência isolada de vantagem”.
O Cade também se manifestou no mesmo sentido. O presidente do órgão de defesa da concorrência, Vinícius Marques de Carvalho, afirmou que, se comprovado o cartel nas licitações da Petrobrás, as empresas envolvidas merecem ser “severamente” punidas.
Há um movimento, que conta com a simpatia do vice-presidente Michel Temer, da Controladoria-Geral da União e do presidente do TCU, Augusto Nardes, para que as empresas envolvidas não seja punidas com declaração de inidoneidade, para não prejudicar a condução das obras públicas em andamento e não afastá-las de futuras licitações.
Carvalho fulmina a proposta, diz reportagem da Folha: “Quando houve a crise financeira de 2008, apareceu o discurso too big to fail’ (grande demais para quebrar). Agora tenho a impressão que aparece um discurso do too big to be punished’, ou seja, grande demais para ser punido. Cartel é uma prática muito lesiva à população”.
Outros destaques
dos jornais do dia
– PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS – O preço da gasolina está entre 20% e 24% mais caro no Brasil do que no exterior. No diesel, a diferença é de cerca de 15%. O cálculo compara o preço praticado no país e no golfo do México, principal referência internacional. Os brasileiros estão pagando mais que os estrangeiros pelos combustíveis, porque o petróleo desabou no mercado internacional, mas a queda não foi repassada no país. O governo foi na contramão e, após a reeleição da presidente Dilma, reajustou a gasolina em 3% e o diesel em 5%. O objetivo do aumento é fortalecer as combalidas finanças da Petrobrás. De 2010 até outubro de 2014, a estatal subsidiou o consumidor brasileiro ao vender gasolina mais barata do que no exterior. O governo resistia a reajustar a gasolina para não elevar ainda mais a inflação. No auge, a diferença desfavorável à Petrobrás chegou a 30%. (“Folha”)
– ATIVIDADE ECONÔMICA – Após apresentar recuperação em outubro, as vendas de automóveis ficaram abaixo das expectativas em novembro. Foram emplacados 279,8 mil carros de passeio e comerciais leves, o que representa queda de 4% na comparação com o mês anterior, segundo a Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores). Na comparação com novembro de 2013, que teve os mesmos 20 dias úteis, a redução foi de 2,9%. No acumulado do ano, há queda de 8,2%. Para a Fenabrave, o dado positivo é a melhora na média de vendas diárias, que ficou em 13,9 mil unidades. O resultado representa alta de 5,6% sobre outubro.
– PREVIDÊNCIA SOCIAL/APOSENTADORIA – Com o aumento da renda e maior acesso à saúde, a expectativa de vida do brasileiro cresceu. A boa notícia, no entanto, traz impactos ao bolso dos novos aposentados, que terão seus benefícios reduzidos, em média, em 0,65%. O percentual vale para todos os que se aposentarem a partir desta segunda-feira (1º) por tempo de contribuição. É que a Tábua de Mortalidade, calculada pelo IBGE e divulgada nesta segunda, serve de parâmetro para o INSS estimar o fator previdenciário, cujo objetivo é evitar aposentadorias precoces. O cálculo considera a idade ao se aposentar, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida, ou seja, quanto tempo o trabalhador deve viver a mais considerando a idade que tem ao pedir o benefício. Segundo o IBGE, a expectativa de vida ao nascer passou de 74,6 anos, em 2012, para 74,9 anos em 2013 –um aumento de 3 meses e 25 dias.
– COMÉRCIO EXTERIOR – A balança comercial apresentou um déficit de US$ 2,35 bilhões em novembro, o pior para o mês em toda a história do comércio exterior brasileiro. O resultado levou o governo a admitir ontem, pela primeira vez, que após 14 anos de superávits anuais, a balança fechará no vermelho em 2014. A última vez em que a balança fechou com saldo negativo foi em 2000, quando as importações superaram as exportações em US$ 732 milhões. Um fator determinante para a revisão nas projeções foi o déficit de US$ 4,221 bilhões acumulado de janeiro a novembro de 2014, o maior desde 1998, período em que o saldo ficou negativo em US$ 6,112 bilhões. As vendas externas totalizaram US$ 207,611 bilhões e as importações, US$ 211,832 bilhões no período. Nos últimos doze meses, a balança ficou deficitária em US$ 1,572 bilhão. As exportações de novembro somaram US$ 15,646 bilhões. Sem os embarques da safra de grãos e fortemente afetada pela queda dos preços das no mercado internacional, as vendas externas caíram 25% ante o mesmo mês do ano passado. As receitas com soja diminuíram 76,6%; minério de ferro, 47,5%; fumo em folhas, 43,2%; e milho em grão, 32,4%.
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