Na véspera do tão aguardado início do ciclo de afrouxamento monetário nos Estados Unidos, que deve ser comunicado na quarta-feira (18), investidores locais esperam, no mesmo dia, por um ajuste na taxa básica brasileira, mas para cima.
A expectativa de alta da Selic é majoritária, mas não é unânime: alguns participantes do mercado entendem que a autoridade monetária brasileira não precisaria mexer no patamar da Selic no momento.
Os argumentos a favor de uma alta são conhecidos de quem vem acompanhando o noticiário econômico nas últimas semanas. A alta do dólar, seja por incertezas fiscais ou pelo desmonte das posições de carry trade, a resiliência da atividade doméstica, a desancoragem das expectativas de inflação colhidas pelo boletim Focus e a falta de credibilidade da nova composição do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) são algumas das principais razões apontadas por participantes do mercado para justificar a necessidade do movimento.
Essa visão ganhou força entre agentes e provocou diversas atualizações de projeções por economistas e de posicionamento por gestores, a ponto da curva de juros precificar na sexta-feira (13) 1,25 ponto percentual de alta na Selic ainda em 2024, levando o juro a 11,75% no fim do ano. E mais aproximadamente 0,5 p.p. de elevação em 2025, finalizando o ciclo de aperto com a taxa básica no patamar de 12,25%.
Entre os dissidentes, os motivos para acreditar que os juros não precisam subir passam pela noção de que a Selic já está suficientemente restritiva, e que é preciso tempo para ver o efeito da medida. Ainda, que o BC não precisa apertar a política ainda mais em busca de credibilidade.
Nesse grupo está Rafael Ihara, economista-chefe da Meraki Capital, que afirma que parte relevante da pressão na curva de juros se deu por conta da fraqueza do câmbio, que por sua vez foi parcialmente provocada por incertezas fiscais.
O mercado teria ficado assustado com o crescimento real das despesas no primeiro semestre, mas o executivo afirma que muito disso foi antecipado por conta das eleições municipais e que haverá devolução na segunda metade do ano. Paralelamente, entende que o desmonte das posições de carry trade também pode estar acabando, com a queda do mercado acionário japonês limitando a postura conservadora do Banco do Japão (BoJ).
Ainda, afirma que as expectativas de inflação mais longas, para 2026 e 2027, já estavam desancoradas no começo de 2023 e isso não impediu um ciclo de afrouxamento de 3,25 pontos percentuais; e que, apesar da atividade mais forte que o previsto, o hiato do produto registrou pouca variação desde 2021.
“Ficou um clima ruim depois da divisão do Copom em maio e o novo presidente do BC, Gabriel Galípolo, tem adotado uma postura mais ‘hawkish‘ em busca da credibilidade perdida. Mas não é subindo a Selic em 1 p.p. ou 2 p.p. que essa dúvida vai ser eliminada. Manter o juro parado enquanto o resto do mundo corta já é uma postura conservadora”, diz. “A política monetária atual já está em território contracionista, em um nível que só ocorreu em ciclos passados quando a inflação estava com a dinâmica muito pior.”
Caso o BC decida elevar a Selic, Ihara acredita que o mercado provavelmente pedirá cortes agressivos de juros em poucos meses. Assim, entende que não faz sentido subir os juros para cortar logo em seguida e que essa volatilidade é extremamente prejudicial para o planejamento financeiro das empresas e para os investimentos no país.
Marco Bismarchi, sócio e gestor de portfólio da TAG Investimentos, também questiona a eficácia de um movimento de altas de juros seguido por outro de quedas. “Não faz muito sentido, porque geralmente demora cerca de 18 meses para a política monetária fazer efeito”, diz. “Tivemos troca de comando e o Galípolo, tentando conquistar autoridade, acabou se comunicando muito com o mercado e se colocando em uma posição difícil.”
Ele acredita, então, que se o ciclo de aperto for pequeno, os impactos econômicos e nos ativos podem ser limitados. Mas nota que, no mínimo, empresas que estão muito alavancadas podem sofrer com o aumento do custo de dívida.
Mesmo assim, afirma que o modelo do próprio Banco Central aponta para uma inflação que converge para ao redor da meta de 3% em 2026, que é o horizonte relevante com que a autarquia trabalha atualmente, com a Selic parada. E isso deveria bastar para a manutenção do patamar atual do juro básico.
Essa é a mesma tese dentro do C6 Bank. Em nota, o banco digital defende que a projeção de inflação no horizonte relevante deve permanecer em 3,2% ou um pouco abaixo disso”, o que justificaria a manutenção da Selic “em patamar contracionista”.
Opinião semelhante é compartilhada por Rafael Cardoso, economista-chefe do departamento de pesquisa econômica do Banco Daycoval. Mesmo com expectativas de inflação elevadas e câmbio depreciado, diz, a modelagem do próprio BC indica que os juros a 10,5% bastariam para levar a inflação para a meta.
“Em todo o mundo se questiona os efeitos dos juros elevados na economia e nos ativos, até porque o Fed elevou os juros em mais de 5 pontos percentuais e mesmo assim não tivemos a desaceleração que se imaginava”, diz. “No Brasil vimos um fenômeno parecido, PIB forte e inflação em queda.”
O Daycoval projeta um PIB próximo de 3% em 2024 e de 2% para 2025, em linha com o que esperavam no fim do ano passado. Cardoso afirma que é de se esperar que eventualmente os juros mais altos consigam desacelerar a atividade, mas isso não ocorreu nos últimos anos. “A política monetária em patamar muito contracionista foi, em parte, contrabalanceada pelos estímulos fiscais. Agora, podemos ter uma ausência de estímulos com juros ainda altos e, portanto, uma “tirada de escada” da atividade econômica.”
Flávio Aragão, sócio da 051 Capital, aponta para o mesmo caminho. Após forte estímulo fiscal, que injetou R$ 150 bilhões na economia e teve impacto inflacionário e no PIB, entende que a política monetária local pode ter perdido um pouco de eficiência ao nos últimos meses.
“Mas será que faz sentido subir juros agora que isso está perdendo tração? Acredito que daria para esperar a política monetária agir, para entender se o patamar atual é restritivo o suficiente. O Fed também deve iniciar uma sequência de cortes, o que permitirá analisar o comportamento do dólar e da inflação. Não é porque não vai subir agora que nunca mais vai poder subir”, afirma.