O mercado financeiro trabalha se antecipando aos fatos para não perder dinheiro, e uma das apostas confiantes do momento foi confirmada nesta quarta-feira (31), após o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) anunciar a manutenção da Selic em 10,50% ao ano.
O Copom avaliou que as conjunturas doméstica e internacional exigem ainda maior cautela na condução da política monetária, e chamou atenção para possíveis impactos inflacionários decorrentes dos movimentos das variáveis de mercado e das expectativas de inflação.
Entre especialistas em investimentos, a avaliação consensual é de que a renda fixa está, sim, atrativa, mas o investidor tem alguns deveres de casa, como rever os indexadores dos ativos, apostar em títulos curtos e mesclar a carteira com fundos de crédito. Também precisa dar mais atenção a aplicações nos Estados Unidos, especialmente após as declarações mais recentes de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (o banco central americano).
Por outro lado, a visão é de que a Bolsa brasileira está barata, com oportunidades para quem tem estômago para suportar mais riscos, com o objetivo de colher os frutos quando a poeira baixar.
- Assista à live da XP repercutindo a decisão do Copom
Confira as avaliações e recomendações de analistas para as seguintes classes e subclasses de ativos:
- Renda fixa
- Ações
- Investimentos no exterior
- Fundos de crédito e multimercados
- Fundos Imobiliários (FIIs)
Renda fixa
Apesar do juro ainda alto, os títulos atrelados ao CDI não são os preferidos dos analistas. Nos títulos públicos, o Tesouro Selic ainda tem espaço relevante nas carteiras, mas as recomendações apontam para aumento da concentração em títulos de inflação e prefixados. “As NTN-Bs (Tesouro IPCA+) ainda são nossas favoritas, gostamos do vencimento em 2032, que não é tão longo para ser impactado pelo fiscal”, argumenta Marco Bismarchi, sócio e gestor de portfólio da TAG Investimentos. Os atrelados à inflação também são indicação da XP, que tem preferência por títulos de duração de 6 anos.
A favor dos prefixados, Ricardo Nunes, CIO de crédito da Paramis Capital, aponta precificação de aumento na Selic na curva de juros, algo que a casa não considera provável. “Estamos posicionados em prefixados curtos, até janeiro de 2026; acho que a alta de 2 pontos percentuais na Selic se materialize”, explica Fábio Guarda, sócio e gestor da Galapagos Capital.
Leia também: Em tempos de IPCA+6%, mais ricos dobram fatia do bolo aplicada em títulos de inflação
Já no crédito privado, a diferença de remuneração que as empresas grandes oferecem nas debêntures na comparação com o Tesouro Direto não compensa o risco para o investidor aplicar por conta própria, segundo os analistas (veja mais recomendações para fundos de crédito mais abaixo).
“Vimos uma compressão de spreads (juros adicionais em relação ao papéis públicos) nos papéis de maior qualidade que já passou do racional”, diz o CIO da Paramis. Ele explica que a casa está esperando abertura nas taxas para comprar papéis de qualidade e, por enquanto, foca em operações mais curtas e em papéis considerados mais arriscados, que pagam mais.
Nunes explica que escolher os papéis independentemente do setor é importante nesse momento, mas destaca que saneamento e transmissão de energia são áreas bem vistas pela gestora: “têm contratos fortes, de longo prazo e corrigidos pela inflação”. Por outro lado, olham com atenção para imobiliárias e empresas de consumo, mais sensíveis aos juros e que podem sofrer com a alta de custo de dívida se a Selic ficar alta por muito tempo ou até subir.
Ações
O Ibovespa vem se recuperando (lentamente) do tombo de 7,6% no primeiro semestre. Renato Nobile, gestor e analista da Buena Vista Capital, acredita que as ações seguem “muito atrativas em preço, principalmente fazendo stock picking”, ou seja, escolhendo analisando as empresas independentemente dos setores, já que há oportunidades mesmo nas áreas com maior desconfiança do mercado.
E o gestor não fica só no discurso: elogia as ações da Sabesp (SBSP3), mesmo não gostando do setor de saneamento básico. “O preço tem desconto interessante e pode dobrar de valor após o movimento de privatização”, justifica Nobile. Para ele, as administradoras de shopping centers estão muito baratas: “Allos (ALOS3) vem em primeiro lugar, depois Iguatemi (IGTI11). Elas estão negociando muito abaixo do que deveria, não me lembro de níveis tão atrativos”.
Monica Araújo, estrategista de renda variável da InvestSmart, olha mais para o copo meio vazio. Preocupada com “um cenário doméstico ainda desafiador, em especial pela trajetória do fiscal”, ela recomenda o investimento em setores mais resilientes, “com menor volatilidade de resultados e com perspectivas positivas de crescimento nos lucros”: energia, telecomunicações, bancos e saneamento básico.
Investimentos no exterior
Lá fora, a renda fixa também tem apelo. Os investidores já vislumbram um corte nos juros dos Estados Unidos em setembro, mas as taxas seguirão altas para o país que tem a maior economia do mundo. Mais focada em renda variável, a Gauss Capital ainda enxerga oportunidade na renda fixa americana. “Operamos a curva americana como um todo, principalmente alongando duration (prazo médio de recebimento dos fluxos de um título)”, explica Igor Campos, portfolio manager de renda fixa da Gauss.
Na renda variável, o destaque é a bolsa americana, que tem múltiplos mais elevados que a brasileira, e “são índices de altíssima qualidade, você pode estar comprado para o resto da vida que vai ganhar dinheiro”, diz Nobile. O setor de tecnologia, que vem impulsionando o S&P 500 é um de seus preferidos. Ele recomenda as ações da Meta (M1TA34), “fez o dever de casa em Inteligência Artificial”, e da Alphabet (GOOGL), que tem “crescimento elevado, ROI (retorno sobre investimento) fantástico”, mas que está descontada porque o mercado acha que está para trás em IA. “Achamos que o mercado está equivocado”, diz o especialista.
Fundos de crédito e multimercados
O momento é desafiador para comprar papeis de crédito privado por conta própria, mas a aplicação via fundos pode ter vez na carteira. Na visão de alocadores, esses ativos e produtos com retorno atrelado à inflação são algumas das principais apostas para surfar esse período de Selic elevada por mais tempo. Mesmo com spreads menores nos papéis de crédito privado, gestores avaliam que o carrego está interessante.
Na XP, os spreads menores deixam as alocações um pouco mais táticas. “Tudo parte do risco soberano, e se os títulos públicos estão apreçando um risco alto, o título privado também vai estar. Então apesar do spread ter fechado, ele ainda existe e as taxas continuam elevadas”, avalia Rachel de Sá, estrategista de investimentos da XP (assista à análise completa no vídeo acima).
Por outro lado, gestoras aproveitaram a janela mais difícil em termos de retorno para reduzir a exposição a multimercados. Especialistas defendem que ainda vale a pena manter uma alocação nesse tipo de fundo por causa da agilidade que gestores costumam ter para alocar, mas que uma seleção criteriosa das gestoras é o mais indicado para este momento.
Fundos Imobiliários (FIIs)
Embora ativos de risco como fundos imobiliários (FIIs) tenham sofrido ao longo deste ano, algumas casas têm discutido um eventual aumento da alocação. André Freitas, da Est Gestão de Patrimônio, diz que o dividend yield (retorno com dividendos) dos produtos está num patamar “interessante” e sugere um mix entre fundos de tijolos (que investem em imóveis físicos) e fundos de papel (que alocam em títulos de dívida imobiliária) para incrementar os retornos da carteira.
Leia mais: FIIs passam por série de “incorporações”; o que é e como isso afeta investidores?
Já Catherine Cruz, CIO da Integrity Wealth Management, aponta oportunidades em vários FIIs que estão com as cotas bastante descontadas, mas pondera que o investidor precisa ter paciência ao entrar nesse tipo de mercado. “É um mercado em que há muita pessoa física. Fundos podem ser penalizados mesmo que os fundamentos estejam bons”, resume.
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