Inflação alta e volátil, ciclos econômicos mais curtos e bancos centrais sempre um passo atrás das mudanças macroeconômicas, lembra um pouco o Brasil, mas na verdade é a previsão de um novo normal para a economia global, destacaram Andrew Reider, CIO da WHG e Brian Doherty, diretor de gestão e investimentos da Wellington Management.
O tema foi assunto hoje de debate na Expert XP, em São Paulo (para acompanhar as palestras online ou presencialmente acesse aqui).
Um dos grandes questionamentos do mundo, na visão dos especialistas, é se de fato estamos diante de uma crise global, ou se vivenciamos uma recessão técnica, que será curta. Para Andrew Reider, CIO da WHG, a possibilidade de uma recessão global não parece ser necessariamente um evento traumático e por este motivo os mercados não apresentaram uma pressão tão forte em julho. “As pessoas estão vendo que talvez a gente chegue no ponto ideal, mas que isso vai ser saudável para a economia que estava superaquecida”, destacou Reider.
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Na visão do CIO da WHG, há muito estímulo na economia global, e é preciso normalizar a economia americana, sendo este movimento exatamente o que as autoridades monetárias estão fazendo. Ele citou que durante a pandemia houve muito estímulo econômico, taxas em níveis baixos nunca antes vistos e que tudo isso gerou especulação; e agora as autoridades monetárias estão tentando segurar os efeitos.
“Vemos que a economia está saudável, não tem nada desabando do precipício. Todos os principais indicadores estão em rolagem, mas o ciclo econômico foi muito diferente dos outros na economia global, o que pode ser bom”, cita.
Para Reider, podemos estar diante de um resfriamento saudável da economia e não de uma recessão profunda.
Esta visão também é partilhada por Brian Doherty, da Wellington Management, que acredita em uma desaceleração econômica nos próximos 3 ou 4 meses, mas que não deve se traduzir em recessão.
“A esperança é que a gente veja uma recuperação contínua da China, que deve dar suporte ao ciclo global. Depende da covid-19 não ressurgir e afetar as atividades econômicas, mas com base nas nossas análises, achamos que teremos uma queda significativa da demanda”, afirma Doherty.
Contudo, para o diretor da Wellington Management, o banco central americano não deve restringir a economia o suficiente para gerar uma recessão nos próximos três ou quatro meses. Ele cita ainda a recuperação da China a partir de setembro, porém, na visão dele, não é onde a história se encerra.
“Infelizmente, na nossa visão, a política monetária dos Estados Unidos está frouxa demais, e se a inflação continuar podemos ver um banco central americano sendo obrigado, na metade de 2023, a restringir as políticas para desacelerar as atividades. Isso seria uma surpresa significativa em todos os sentidos”, destaca Doherty.
Ele cita ainda que os mercados estão tentando evitar uma recessão no curto prazo, mas no próximo ano o banco central americano ainda tem um longo debate caso a inflação continue aumentando. “No curto prazo, acredito que vamos conseguir evitar a recessão, mas no próximo ano pode haver outros eventos”, completa.
Novo normal da inflação
A meta de devolver a inflação para o patamar de 2% parece estar distante, na visão dos especialistas.
Segundo Andrew Reider, da WHG, o mercado criticou o banco central americano por ter tido uma postura transitória em 2021, porém ressaltou ser necessário considerar que o mundo passou por guerra, lockdown da China, além de outros problemas, que pioraram a questão de fornecimento na cadeia de suprimentos. “Muitos americanos acham que a inflação cair para 2% é loucura”, diz.
Para Reider, o mundo precisa ser visto sob quatro quadrantes: inflação, crescimento e um outro eixo com inflação baixa e crescimento razoável, que é o melhor lugar onde o mundo poderia estar, mas depois da covid-19 esse cenário mudou. “A questão é se estamos vivendo uma estagflação, como na década dos 70, ou se estamos em um mercado de alto crescimento, mais otimista e diante de uma economia que não vai entrar em recessão. Mas a gente vai ter que viver com a inflação elevada”, reforça.
Reider lembra que o Federal Reserve, banco central americano, já comentou que taxas de juros elevadas não são um cenário muito bom, mas levando em conta que os Estados Unidos são uma economia orientada a mercado, não devemos ver uma destruição desta. “A classe média vai ver que os preços que estão pagando são loucura e começar a cortar os gastos e a demanda vai cair”, comenta.
Ele cita que ao mesmo tempo a China está reabrindo, há navios com grãos saindo da Ucrânia, preços das commodities recuando para patamares abaixo do que antes da guerra, cadeia de suprimentos se acomodando, e lojas nos Estados Unidos com muitos estoques. “Tudo isso leva a crer que veremos a margem de inflação caindo. Pode ser que ocorra lá na frente ou talvez a inflação vá cair mais rápido do que tudo mundo imagina”, comenta.
O conflito, segundo Reider, é que em algum momento os preços voltem a subir e o banco central americano precise trabalhar com taxas reais positivas, o que preocupa o mercado.
Já na visão de Brian Doherty, da Wellington Management, o caminho até uma inflação menor é importante, mas pode ser que ocorra uma acomodação no regime da inflação, na magnitude do Brasil, mas para a economia de forma mais ampla. “Para a economia global, a inflação será estruturalmente mais alta e volátil no futuro”, avalia.
Doherty destaca ainda que a mudança vai depender de três novos componentes: o primeiro é a inflação mais alta e volátil.
O segundo é que os bancos centrais vão reagir sempre com atraso à inflação. Como consequência, a magnitude das políticas monetárias será mais ampla e os ciclos econômicos se tornarão mais curtos e voláteis. Doherty, cita também uma forte competição entre China e Estados Unidos que devem reforçar o investimento em setores estratégicos, superior ao que eles fariam sozinhos, o que vai contribuir com a inflação.
“Nós já absorvemos os últimos 25 anos de crescimento da China, foi um fenômeno deflacionário enorme, milhões de trabalhadores entraram no mercado de trabalho e mantiveram a inflação negativa por anos, mas isso não vai se repetir”, comenta.
Ainda segundo Doherty, ser banco central era fácil, especialmente nos últimos 15 anos, mas agora se torna um trabalho complexo porque muitos deles vão acabar criando mais volatilidade, porque estarão sempre atrasados nas decisões. “Será que o banco central americano vai fazer um ajuste forte o suficiente ou a inflação vai avançar antes deles facilitarem as políticas”, questiona.
E como resultado desse movimento dos bancos centrais, os ciclos econômicos vão ser mais curtos e voláteis. “Os bancos centrais vão exacerbar os problemas porque vão ser lentos e isso vai mudar os mercados e impactar no valuation (avaliação)”, completa.
Por fim, na visão dos especialistas, o Brasil já experimenta isso, mas agora chegou a vez do efeito acontecer na economia global. O mundo abrasileirou-se.
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